Farofa Carioca: crítica social, irreverência e protagonismo em “Rap do Negão”

Faixa inédita do Farofa Carioca gravada em 1998 com Seu Jorge e Gabriel Moura ganha nova mixagem, incluindo voz do atual vocalista Mario Broder

No Mês da Consciência Negra, o grupo Farofa Carioca reúne os vocalistas de ontem e de hoje Seu Jorge, Gabriel Moura e Mario Broder para o lançamento do single “Rap do Negão – citações: Upa Neguinho e Negro Não Sabe O Que É Dor”, que chega ao streamig dia 19 de novembro via Universal Music Brasil. A música gravada para o álbum “Moro no Brasil”, de 1998, não entrou no disco original e quando a banda e a gravadora trabalharam para o lançamento recente do álbum nas plataformas digitais, “Rap do Negão” foi resgatado recebendo nova mixagem e masterização. Para celebrar o retorno da banda à ativa, a faixa ganhou também a voz do atual vocalista Mario Broder, se unindo a Seu Jorge e Gabriel Moura na interpretação. A música discorre sobre o sentimento e vivências de ser preto no Brasil, entre preconceitos e conquistas.

Embalada pelo contagiante suingue do Farofa, “Rap Do Negão” ganha contornos de jongo com a citação do ponto de capoeira “Negro Não Sabe O Que É Dor”, ecoando os tambores ancestrais do Mestre Darcy do Jongo e vocal lancinante de sua esposa Dona Su. Surpreende também com nuances de samba-jazz a citação de “Upa Neguinho” (Edu Lobo / Gianfrancesco Guarnieri), adornada pela deslizante flauta de Bertrand Doussain sob arranjo de cordas do Maestro Victor Chicri.

Com irreverência e crítica social, características marcantes do grupo, o single aponta a opressão histórica sobre a raça negra e a normalização do racismo na sociedade em frases como: “Tudo começou com a tal da escravidão
 / Onde todo sacrifício era nas costas do negão”. Ou ainda: “É, meu irmão, não é fácil ser negão / se eu for correr na praia, vão dizer ‘pega ladrão’”; e no refrão “Me chamam de negão, de pedaço de carvão / 
De cromado, de fumaça, de café e de feijão”.

Mas o discurso muda de tom ao destacar a potência do negro e seu diferencial quando em igualdade de condições sociais e oportunidades: “Mas eu sei que você sabe
/ Tá cansado de saber / Quando eu chego na parada / É que começa a acontecer / Me deixa estudar, aprender, escrever / Deixa eu ler que você vai ver / Quando eu chego na parada / É que começa a acontecer”.

A capa do single também reflete esse protagonismo, na obra do artista visual paulistano Robinho Santana. A imagem traz um jovem negro semi-encapuzado usando um capelo (chapéu de formatura) e segurando um diploma. O lançamento vem acompanhado por um Lyric assinado por Diego Aragão.

Confira a letra de “Rap do Negão” (Seu Jorge / Gabriel Moura / Wallace Jefferson)
Citações: “Upa Neguinho” (Edu Lobo e Gianfrancesco Guarnieri) / “Negro não sabe o que é dor” (domínio público)

Tudo começou com a tal da escravidão

Onde todo sacrifício era nas costas do negão

Hoje a gente vê que o mundo está mudado

Eu sei que a vida é boa mas pro negro tá suado

Todo mundo diz que crioulo é tudo igual

Que só pode ser sambista ou jogador de futebol

Se a vida tá difícil, a coisa tá ficando preta

Quando o negro é muito grande dizem que animal, que animal! Que animal! Que animal!

É meu irmão, não é fácil ser negão

Se eu for correr na praia
Vão dizer: pega ladrão!!!

“Negro não sabe o que é dor
Negro não tem alma não…”
Assim dizia o feitor

Com seu chicote na mão…

Me chamam de negão, de pedaço de carvão
De cromado, de fumaça, de café e de feijão
Me chamam de negão, de pedaço de carvão

De cromado, de fumaça, de café, ô macaco!

Mas eu sei que você sabe

Tá cansado de saber
Quando eu chego na parada
É que começa a acontecer

Me deixa estudar, aprender, escrever
Deixa eu ler que você vai ver
Quando eu chego na parada
É que começa a acontecer.